As tragédias da vida...

Bombeiro socorrista em Brumadinho 2019



Wilma Rejane

A vida só existe porque também há morte; inversos que tragicamente se completam para dar continuidade a espécie humana. Como o dia, em que brilha o sol, devolvendo o azul claro do céu, tão somente porque existe a noite. E a alegria só se torna possível porque há tristeza. A vida pode parecer óbvia, mas é indecifrável pela presença do inesperado.  E os inesperados da vida, muitas vezes, são considerados tragédia.

O que de fato é uma tragédia? A palavra " tragoedia" tem origem grega e era aplicada a festas em que o canto, a música, era a principal atração. Porém, e de repente, surgia entre os cantores, um animal chamado bode. "tragos = bode e oedia =canto". Portanto, tragédia se caracteriza como uma grande e alegre festa, de final triste, porque o bode era sacrificado como forma de punição por devastar as videiras dos deuses festivos. Tragédia é tudo que se opõe a alegria. É o elemento inesperado que devasta o riso (simbolizado pelo vinho, videira). É o sacrifício da vida embutido de angústia pela perda; o riso se vai e a tristeza ocupa seu rastro, transpondo um caminho desconhecido.


A vida pode ser uma tragédia diária, pois, a todo momento, em todo o mundo, pessoas se deparam com acontecimentos inesperados que provocam dor e lamento. Somos capazes de superar tragédias? Claro que somos! Não temos o poder de evitar certos acontecimentos, mas temos um Deus que nos dá forças em meio a dor. Somente o amor de Deus arraigado em nosso coração é capaz de trazer à memória aquilo que nos dá esperança ( Lamentações 3:21). Somos fracos. É um engano pensar que qualquer religião ou crença nos imunizará do sofrimento.

Deixe-me contar algo incrível: é bem provável que nas  tragédias, exatamente nesse lugar desconfortável, descubramos nossa fé e força.  Assim aconteceu com o  teólogo alemão Jurgen Moltmann (1926) . Quando Moltmann se tornou prisioneiro de guerra, encerrado em um campo de concentração inglês, ele afirmou:“ Vi homens nos campos que haviam perdido a esperança. Eles simplesmente se entregavam e morriam. Mas eu procurei viver trazendo à minha memória momentos de minha infância. Na minha lembrança, me via garoto olhando na janela da casa dos meus pais para as florestas que cortavam o horizonte distante do Norte da Alemanha. Ali, as planícies eram vastas e o céu imenso. O horizonte era o limite que não aprisionava; pelo contrário, me convidava a ir além. Aquele menino tinha muita curiosidade de saber o que havia do outro lado do horizonte".

Moltmann quis se manter vivo para descobrir o que havia do outro lado do horizonte. Isso é curioso, porque a morte poderia ser a forma mais fácil de se descobrir, mas se assim o fizesse, estaria matando também suas lembranças. Ele precisou ser forte e como fortalezas exigem alicerce, sua mente se revestiu de boas lembranças. O horizonte se abria para ele, na vida adulta, para responder pendências da infância. Prosseguir era uma necessidade.

Deus é a real e viva esperança. Sem Ele lembranças são apenas lembranças estacionadas em algum lugar do passado. Ė a fé que traz à nossa memória que Deus pode restaurar qualquer situação de dor. Ė a fé que aponta para um horizonte iluminado, mesmo quando o caminho se mostra escuro.

Não falo de um triunfalismo cego, de emoções fluídas, de ilusão. Falo de um Deus que em meio a uma grande tragédia, ressurgiu com a maior de todas as vitórias! De um Deus que entregou seu bem mais precioso, Seu único filho para ser sacrificado pelos pecados dos homens. Quanta dor sofreu Jesus enfrentou até à morte, mas  ao ressuscitar Ele trouxe de volta toda esperança de Salvação!

A vida pode ser uma tragédia, mas a lembrança constante de que Deus restaura a vida humana, é motivadora. Não será uma tragédia encontrar sentido nas coisas simples enquanto as " tragédias" surgem com a intenção de ocupar nosso universo.

Que nosso bom Deus nos sustente, sempre.

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