Habacuque: O Profeta Existencialista





Habacuque foi considerado por Robson
(Los Doce Profetas Menores, p.99) um profeta filósofo. Yates (Los Profetas Del Antiguo Testamento, p. 215) reputa Habacuque como “o livre pensador entre os profetas”. Nosso profeta, a meu ver, se encaixa no universo dos existencialistas. Ele fala de angústias e desespero humanos, do poder de superação, da restauração da confiança e da redescoberta do sentido da vida. Ele pregou num tempo entre 612 e 605 a.C., um tempo em que impérios violentos se sucediam (1.6-11) e Judá era um campo de pecaminosidade (1.2-4).

O profeta fala da imobilidade divina. Cai um império e surge outro igual ou pior. O tempo passa e a impiedade dos judeus alcança níveis indizíveis; Onde está Deus? “por que, pois, olhas para os que procedem aleivosamente, e te calas quando o ímpio devora aquele que é mais justo do que ele?” (1.13b). A mensagem do profeta é dirigida a Deus e não aos judeus, afirma Isaltino (1990, p.18). Isto é sintomático e impactante. Feinberg (Os Profetas Menores, p.208) afirma que o profeta era porta-voz da angústia de um resto piedoso de Judá. Isto pode ter acontecido, mas é impossível deixar de ver nas palavras pronunciadas com tanto vigor a dor, inquietação, a sua queixa do profeta.

Suas dúvidas não são especulativas. Ele é sincero no que fala. Ele não duvida da existência do Senhor, mas fala com alguém que é vivo: “Não és tu desde a eternidade, ó SENHOR, meu Deus, ó meu Santo?” (1.12 a). O problema é o seu não entendimento da imobilidade divina diante do sofrimento do justo: “Até quando, SENHOR, clamarei eu, e tu não me escutarás? Gritar-te-ei: Violência! E não salvarás?” (1.2).

Habacuque ensina algo que parece paradoxal: A dúvida não é necessariamente inimiga de fé; desesperança não precisa ser considerada como o oposto da esperança. Para ele fé e razão não se anulam, como afirma Isaltino (Habacuque, Nosso Contemporâneo, p.18). Em momento algum se afirma na Bíblia que pensar ou questionar seja pecado. Pecado é a queixa sem sentido ou meramente especulativa. Não é o caso do profeta. Ele expõe seus problemas existenciais na certeza que o Senhor vai lhe falar: “Pôr-me-ei na minha torre de vigia, colocar-me-ei sobre a fortaleza e vigiarei para ver o que Deus me dirá e que resposta eu terei à minha queixa.” (2.1).

“E o Senhor me respondeu.” (2.2). No momento em que ele parou de se queixar e se dispôs a ouvir, recebeu resposta. Deus não falou da complexidade da ansiedade do homem, e não deu respostas à questão do sofrimento do justo e da prosperidade do ímpio. Ele tão somente diz: “o justo viverá pela sua fé” (2.4b). Fé é confiar a despeito das circunstâncias adversas. Fé é ir além dos limites da realidade tangível sem deixar de ter os pés no chão. A alma precisa de fé alimentadora. É através dela que passamos do terreno movediço da dúvida para o terreno sólido da confiança, que faz afirmar: “Ainda que a figueira não floresça, nem haja fruto na vide; o produto da oliveira minta, (...) todavia, eu me alegro no SENHOR, (...). O SENHOR Deus (...)me faz andar altaneiramente.” (3.17-19).

Vivemos um tempo de angústias. Somos reféns da violência, do medo, da impunidade, da imoralidade, da religiosidade, etc. Sufocados, deixamos de ver que o Senhor quer que andemos nas alturas (3.19). Praticamente não mais contemplamos o nosso poder de reação e superação. Acomodamo-nos às circunstâncias, ou então procuramos respostas nas filosofias de vida sobre uma possível ausência de Deus. Vamos “vegetando” de teoria em teoria, de filosofia em filosofia, esquecidos que o justo não vegeta, mas vive; “o justo viverá pela fé” (2.4).

Há percursos maravilhosos no livro de Habacuque: da dúvida à fé, da angústia ao conforto, da desesperança à esperança. Habacuque ensina sobre o Deus que está acima de tudo e nos dá o poder da superação.Acreditemos no Deus disponível. Ele quer receber a nossa queixa, quer que subamos para uma torre e esperemos suas respostas com a certeza da fé. Ele nunca nos deixará. O Senhor é a nossa força (3.19).

David Baêta Motta

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