O chamado de Abraão por uma nova ótica




Israel Institute
Of Biblical Studies
Blog Parceiro do Tenda na Rocha
Autoria: Julia Blum

«Ora disse o Senhor a Abrão:

Sai da tua terra,

Da tua parentela

E da casa de teu pai,
E vai para a terra que te mostrarei.
De ti farei uma grande nação;
E te abençoarei
E te engrandecerei o nome;
Se tu uma bênção.
Abençoarei os que te abençoarem,
E amaldiçoarei os que te amaldiçoarem;
Em ti serão benditas todas as famílias da terra”». [1]


Vocês já tentaram localizar um objeto no GPS ou em qualquer outro dispositivo de navegação? Vocês veem um ponto vermelho piscando na telinha. Normalmente, vocês estão interessados na «street view» (vista da rua), mas também podem fazer zoom (aumentar ou diminuir) da vista da rua da vista da cidade, da vista do estado, da vista nacional e, finalmente, da vista do mundo. Vocês ainda verão o mesmo ponto vermelho intermitente, mas agora está situado no mapa de uma cidade, um país ou no mapa do mundo inteiro. Algo semelhante está acontecendo aqui. Ao lermos os três primeiros versículos deste capítulo, podemos observar Deus se afastando da casa onde mora uma determinada família. À medida que ele se afasta, vemos os descendentes desta única família se tornarem uma grande nação, e então vemos toda a vista do mundo, onde esta família alcançou todas as famílias da terra.
O versículo 1 começa com um homem e uma família: é como se pudéssemos ver esse homem em particular, Abraão, parado em uma rua particular de Harã, ao lado de uma casa particular —a casa de seu paiAbraão viveu aqui por muitos anos, mas agora é ordenado a partir: «Ora o Senhor disse a Abrão: “Saia da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai, e vai para a terra que te mostrarei».
No contexto dessa terra diferente, completamente desconhecida, o próximo versículo se aproxima do nível nacional. De repente, vemos a família de Abraão transformada em «uma grande nação» com um «grande nome». A bênção de Deus é prometida a essa nação, e a própria nação é prometida como uma bênção. Este é o segundo passo no plano de salvação de Deus: «de ti farei uma grande nação; e te abençoarei, e te engrandecerei o nome».
E então, finalmente, o zoom de Deus se move para uma vista de mundo e vemos o mesmo ponto vermelho, agora piscando num mapa do mundo inteiro. O mesmo homem que vimos na «street view» (vista da rua), nas ruas estreitas de Harã, e depois na «vista nacional» como o pai de uma grande nação, agora vemos na «vista do mundo», quando Abraão se torna o pai de muitas nações.
«Abençoarei os que te abençoarem,

e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem;

em ti serão benditas todas as famílias da terra».


Todos nós estamos familiarizados com estas palavras, e sabemos que tudo o que Deus prometeu naquele dia a Abraão, Ele literalmente cumpriu. Ele tornou Abraão em uma grande nação e esta nação realmente se tornou uma bênção para todas as famílias da terra. No entanto, tentem imaginar essas mesmas palavras como Abraão as ouviu há 3000 anos, quando nada disso havia acontecido ainda: quem teria acreditado nessas magníficas promessas? Muitas vezes me pergunto onde esse homem conseguiu sua fé —aquela fé absolutamente única que o fez confiar no Senhor e seguir Seus mandamentos, mesmo quando pareciam extremamente complicados, dolorosos ou ilógicos—. Durante quanto tempo foi um verdadeiro crente antes de ouvir Deus dizer «lej-leja» (sai) e depois fazer o que lhe foi dito? E ele foi realmente o primeiro a ouvir essas palavras?

O pai e o filho
O famoso capítulo 12 do livro de Gênesis —onde a história de Abraão começa e a Escritura se torna uma crônica de uma família— começa com as famosas palavras de Deus para Abraão que acabamos de ler: «Sai da tua terra, da tua parentela eda casa de teu pai, e vai para a terra que te mostrarei». Gerações de rabinos, pregadores e estudantes regulares das Escrituras foram impressionados, encorajados e inspirados por essas palavras. Inúmeros projetos e organizações Judaicas receberam o nome dessas famosas palavras «lej-leja», as palavras Hebraicas que iniciam este capítulo. Para mim, pessoalmente, no entanto, não são essas palavras que retratam a parte mais impressionante deste capítulo, ou que nos fornecem um vislumbre da personalidade notável daquele a quem Deus chamou seu amigo; não são as palavras de Deus que tornam esta história tão especial —é como Abraão respondeu a elas—.
Deixe-me explicar o que quero dizer. No versículo 5 lemos«Levou Abrão consigo a Sarai, sua mulher, e a Ló, filho de seu irmão, e todos os bens que haviam adquirido, e as pessoas que lhe acresceram em Harã. Partiram para a terra de Canaã וַיֵּצְאוּ לָלֶכֶת אַרְצָה כְּנַעַן e lá chegaram»[2]  Assim, em resposta ao chamado de Deus, Abraão saiu para ir à terra de Canaã. Então, depois de um tempo, ele realmente chegou à terra de Canaã. Nada, ao que parece, poderia ser mais óbvio e claro do que esta simples frase. É preciso dizer que quando as pessoas iniciam uma jornada, elas pretendem terminar esta jornada e chegar ao local para onde estavam indo? No entanto, apenas alguns versículos antes, no final do capítulo anterior, lemos:
«Tomou Terá a  Abrão, seu filho, e a Ló, filho de Harã, filho de seu filho, e a Sarai, sua nora, mulher de seu filho Abrão, e saiu  com eles de Ur dos Caldeus, para ir à terra de Canaã; foram até Harã, onde ficaram». [3]
וַיֵּצְאוּ לָלֶכֶת אַרְצָה כְּנַעַן
Nem toda tradução é tão notavelmente óbvia quanto é no Hebraico: o começo deste verso é o mesmo em ambos os casos:       וַיֵּצְאוּ לָלֶכֶת אַרְצָה כְּנַעַן, ambos partiram para ir à terra de Canaã —no entanto, ela termina em uma maneira completamente diferente—. O pai de Abraão, Terá, também partiu para a terra de Canaã —mas nunca completou a jornada—. Ele nunca chegou.
Por que Terá começou a jornada para Canaã em primeiro lugar? Eu pessoalmente acredito que antes de Deus falar com Abraão, Ele havia falado com seu pai; caso contrário, Terá deixaria Ur e começaria a ir a Canaã? Sabemos que Terá não adorou o único Deus verdadeiro. Sabemos disso, não apenas dos escritos rabínicos, mas também das próprias Escrituras: «É isso que o Senhor Deus de Israel diz: “Há muito tempo seus antepassados, incluindo Terá, pai de Abraão e Naor, viveram além do rio Eufrates e serviram outros deuses”». [4] De maneira alguma isso significa, no entanto, que Terá nunca tinha ouvido falar sobre o verdadeiro Deus, ou que ele nunca tinha ouvido falar do verdadeiro Deus. Talvez o primeiro «lej-leja» (sai) foi falado com Terá; talvez tenha sido Terá que deveria ter se tornado o pai das nações. No entanto, mesmo que todos desejamos ouvir a sua voz, todos desejamos ter um encontro divino, não cometer erros, não é o encontro divino que define o nosso destino, mas o que fazemos depois desse encontro. Não é o que Ele diz para nós que nos define, é como respondemos ao que Ele dizNão é o suficiente ser chamado; é preciso permanecer fiel a esse chamado. É provável que Terá tenha sido chamado primeiro, antes de seu filho, e ele provavelmente respondeu a esse chamado dirigindo-se a Canaã. No entanto, ele nunca chegou lá. Ele parou em Harã, porque morar em Harã era muito mais confortável e seguro do que morar em tendas em Canaã, e assim, Terá nunca se tornou o que ele poderia e deveria ter se tornado.
Nesse sentido, o pequeno versículo a respeito de Abraão «…partiram para a terra de Canaã e lá chegaram» é muito mais do que meramente um comentário técnico. A descrição bíblica da grande fé de Abraão começa aqui, em Gênesis 12:5; não só ele se propôs a fazer o que ele foi chamado e mandado fazer, mas ele completou. Se Terá foi chamado por Deus, e eu acredito que ele foi, ele respondeu ao chamado de Deus, começando a fazer o que ele foi chamado a fazer, mas ele nunca terminou. Abraão foi chamado por Deus —sabemos que ele foi— e ele respondeu ao chamado de Deus, não apenas começando, mas, na verdade, completando e realizando tudo o que ele foi chamado a fazer. Isto é o que é a fé, e não é de admirar que Abraão e seu pai tenham sido tão diferentes. Abraão tornou-se pai de um povo e de povos, enquanto a Escritura não nos diz virtualmente nada sobre Terá, exceto o fato de que ele era descendente de Sem e pai de Abraão. Esta é uma lei espiritual que todos nós devemos estar cientes de: Nós escolhemos o nosso destino, pela  forma como respondemos ao chamado de Deus.
 Uma fome na terra
Abraão recebeu alguma recompensa por obedecer a Deus tão incondicionalmente? Se olharmos para as circunstâncias de sua vida depois que ele chegou à terra em plena obediência ao mandamento de Deus, encontramos apenas recompensas «invisíveis» —aquelas vistas apenas pela fé—. Quando o SENHOR apareceu a Abraão, e disse: «Darei à tua descendência esta terra», ele e sua família estavam vivendo em tendas e ainda eram completos estrangeiros e recém-chegados naquela terra. Como eu amo essa interação de visível e invisível na Palavra de Deus. Toda a Bíblia é sobre o contraste entre coisas que são vistas e coisas que não são vistas. Repetidas vezes, nos ensina a viver pela fé, a ter certeza das coisas não vistas, nos ensinando através das histórias e das pessoas sobre as quais lemos. A história de Abraão é provavelmente a primeira história no Tanaj, onde este contraste é tão óbvio: No reino invisível, Abraão é escolhido por Deus para o seu plano e seu pacto; ele será o pai de uma nação e de nações e um dia possuirá esta terra. No reino visível, no entanto, ele vive em tendas, «ele fez sua casa na terra prometida como um estranho em um país estrangeiro», e mesmo isso não foi o pior. Para piorar a situação, havia uma fome na terra: «Havia fome naquela terra; desceu pois, Abrão ao Egito, para aí ficar; porquanto era grande a fome na terra».[1]
E assim Abraão, com 75 anos de idade, obedeceu a Deus e fez algo que muitos de nós não seriamos capazes: «Pela fé Abrão, quando chamado, obedeceu a fim de ir…, e partiu sem saber aonde ia».[2] Ele provavelmente esperava algum tipo de recompensa por essa incrível obediência, por essa ação verdadeiramente notável —ou talvez pelo menos sua esposa o fizesse—. Em vez disso, a primeira coisa que os recebeu em sua chegada foi uma fome. Com todo o respeito à matriarca bíblica, posso imaginar que Sara perguntou ao marido mais de uma vez: «Por quê? Por favor, lembre-me exatamente por que viemos aqui? Por que deixamos nossa vida tranquila e confortável em Harã e viemos aqui para morar em tendas, perambular de lugar em lugar e agora morrer de fome?» Abraão teve uma revelação pessoal, um chamado pessoal de Deus e uma fé forte; Sara não teve nada disso, e assim, para ela, posso imaginar que essas dificuldades que «recompensaram»seu movimento sem precedentes, pareceriam bastante irracionais e até injustas.Alguém tem que ter um relacionamento real com Deus para ser capaz de viver pela fé e ter a certeza das coisas não vistas. Sara precisava experimentar o amor de Deus primeiro; só então ela seria capaz de viver sua vida por amor a Ele. Com toda honestidade, acredito que esta é a principal razão pela qual Deus permitiu que o episódio Egípcio, terrível e altamente desagradável, fizesse parte da história de Abraão —por causa de Sara—.
Temendo por sua vida…
Para mim, pessoalmente, no entanto, toda a passagem sobre Abraão que desceu ao Egito na segunda metade de Gênesis 12 é absolutamente preciosa porque nos ensina várias lições valiosas. Primeiro, aprendemos que ser obediente a Deus e permanecer em sua vontade não significa estar a salvo de todas as dificuldades. Abraão fez uma coisa incrível, deixando para trás tudo e se aventurando em uma nova terra na idade avançada de 75 anos, mas a primeira coisa que encontrou na terra, em vez de recompensa e bênção, foi essa fome.
Quantas vezes —muitas para serem contadas— fui consolada por esses versículos? Quando vocês fazem algo que Deus lhes chama a fazer, esperando recompensa e bênçãos e portas abertas, mas em vez disso se encontram em uma situação muito difícil, que conforto, então, saber que vocês não estão sozinhos. Abraão experimentou a mesma coisa, então estamos realmente em boa companhia.
No entanto, esta passagem ensina ainda mais. As Escrituras não retratam Abraão como um herói da fé irrepreensível, uma espécie de super-homem espiritual, e esta é a beleza da Bíblia, que nunca tenta embelezar as pessoas que descreve. Logo após este incrível ato de obediência sem reservas e completo, justamente quando ele chega à terra, Abraão desce ao Egito para escapar da fome. Em primeiro lugar, eu nem tenho certeza de que esta pequena viagem foi aprovada pelo Senhor, mas as Escrituras nada dizem sobre isso. No entanto, enquanto no Egito, por medo de sua vida, ele faz algo que é muito difícil para nós justificarmos ou entendermos, quanto mais imaginar alguém realmente fazendo isso: ele passa sua esposa como sua irmã. «Dize, pois, que és minha irmã, para que me considerem por amor de ti e, por tua causa me conservem a vida».[3]
No início do capítulo 12, Abraão está disposto e capaz de deixar tudo e todos para trás, a fim de obedecer a Deus, mas apenas alguns versículos depois, o mesmo homem que acabou de cometer um ato de incrível coragem comete um ato de incrível covardia. Para mim, no entanto, a fé de Abraão e a obediência de Abraão se tornam ainda mais preciosas depois desta história. Agora sabemos, sem sombra de dúvida, que ele não é super-homem, que ele tinha fraquezas e medos, que ele não é nem muito corajoso nem corajoso por natureza. Muito provavelmente, esta descida para o Egito e mentir sobre sua esposa expôs a falta de confiança de Abrão, que precisava ser tratada. Não é por acaso que, depois de sua experiência Egípcia, o encontramos «entre Betel e Ai».[4] Em Inglês, esses nomes não significam nada, mas em Hebraico este texto é muito profundo e reflete a jornada espiritual de Abraão: Betel significa «casa de Deus», e Ai ou Hai significa «monte de ruínas». Abraão estava entre a «casa de Deus»… e o «monte de ruínas».
As pessoas às vezes perguntam: «Foi a vontade de Deus que Abrão tenha descido ao Egito?» Provavelmente, a perfeita vontade de Deus era que Abrão confiasse nele, no entanto essa «descida»se tornou parte da «subida». A palavra Hebraica para «bênção» ( ברכה; braja)tem uma etimologia muito profunda; a explicação tradicional é que ela está conectada à raiz ( ברך; berej), que significa «joelho»: é preciso se ajoelhar para obter uma bênção. É preciso que se tenha  humildade para ser abençoado, é preciso ser capaz de reconhecer e admitir que  não se é auto-suficiente, que se precisa de sua ajuda, que se precisa de sua bênção. Eu acho que Abraão nunca teria alcançado essas dimensões de obediência e confiança no Senhor de que ele é conhecido e amado por ele, se ele não tivesse passado por essa experiência dolorosa do «monte de ruínas».
 Deus nos abençoe.

4 comentários:

Maria Aparecida Alves disse...

A paz do SENHOR a todos!

Irmã Wilma Rejane,

Agradeço a DEUS por sua vida, pela maravilhosas mensagens Bíblicas, acabei de ler, e fui as lágrimas, maravilhosa explanação desta passagem Bíblica, sobre a vida de Abraão, certamente, aprendi mais um pouco da palavra de DEUS. Edificante foi para mim, a revelação do Espírito Santo para voce, sobre o chamado de Abraão, por uma nova ótica. Lindo demais, amei.
Que DEUS continue esta linda obra em sua vida, e nos demais colaboradores deste Blog. Que DEUS abençoe também todos os demais leitores deste edificante Blog.Em o nome do SENHOR JESUS CRISTO, amém.

Clara disse...

Nossa! Essa palavra falou tremendamente ao meu coração.

Wilma Rejane disse...



A paz do Senhor, Maria Aparecida!

Já escrevi muitos artigos sobre Abraão, inclusive um livro ( A Primavera de Sara), mas este estudo do blog, não é de minha autoria, é da Julia Blum do Instituto Biblico de Israel.

O Instituto é um centro de ensino da língua hebraica e com profissionais estudiosos da Bíblia. Fiquei muito feliz e surpresa quando me contactaram diretamente de Israel para propor parceria. Por esta causa, tenho tido conhecimento de estudos como este e partilhado aqui no blog.

Também falou profundamente comigo.

Muito obrigada por sua companhia conosco.

Amém e amém.

Abraço em Cristo.

Wilma Rejane disse...



Olá Clara,

É de fato uma mensagem edificante.

Obrigada pela companhia,

Abraço em Cristo.